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Como trabalha Carolina Bergier

3 de maio de 2017 by José Nunes

Carolina Bergier é facilitadora de processos individuais e coletivos em alinhamento vocacional e fundadora da Casa Sou.l.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?

Eu demoro pra acordar. Já assumi que tenho pelo menos 20 minutos de botão soneca. Depois de conseguir levantar, medito por pelo menos 10 minutos. Faz muita diferença pra mim não começar o dia com os olhos no celular. Depois faço a cama, bato um spoonie no liquidificador (é como chamo um suco de comer com colher, que tem além de frutas, chia, espirulina e nibs de cacau), tomo meus complementos e faço exercício físico. Não tenho uma rotina diária definida, cada dia tem um horário diferente, então tem dias que tenho reunião ou atendimento logo cedinho e o acordar fica mais corrido. Aí o exercício fica pra outro momento do dia. O desafio do momento é só olhar o celular depois desse ritual matinal ter terminado. Ainda não consegui. Aliás, escrever sobre produtividade aqui vai ser desafiador, pois estou num momento de buscar ter mais disciplina e menos vícios digitais. Vai ser um exercício interessante escrever.

Como você administra o seu tempo? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?

Eu só sei ter vários projetos rodando ao mesmo tempo. Tenho muita gana de iniciar e estou sempre com novos projetos começando. Me sinto viva. O desafio é que cada projeto tem um time diferente. Sincronizar as agendas de todos os envolvidos tem sido um fator de desgaste.

Busco ter janelas abertas na agenda pra responder e-mails e fazer o que preciso pra cada um dos projetos, além de cuidar da casa e de mim mesma.

Desenvolvi um método que tem me ajudado muito. Uso o Google Agenda como calendário e cada área da vida tem uma cor. Atendimentos têm uma cor, reuniões, outra. Momentos de trabalho eu comigo mesma, outra. Cuidado com saúde, com a casa, com as relações. Cada coisa tem uma cor. Assim, na noite de domingo, quando paro pra me organizar pra semana, consigo ter uma visão geral de onde estou alocando meu tempo. Se há pouco tempo pra minha saúde, eu vejo o que pode ser reagendado para outro momento, porque o custo de não cuidar de mim é alto demais. Não só pra mim, mas pras pessoas que amo e pro meu trabalho.

Eu determinei no início do ano que não atendo nem 2a nem 6a feira. São dias que reservo para reuniões mais longas, terapia, família e pra engatar o fim de semana em viagens. Também congelo parte do dia pro exercício, nem que sejam só 40 minutos, quatro vezes por semana.

Outra coisa que faço pra me organizar é listar todos os afazeres da semana que não estão na agenda: ir ao mercado, ligar pra tal pessoa, ir ao banco, me preparar pra uma reunião. Depois de listar tudo, olho pra agenda e vejo o que pode ser encaixado em cada dia. Aí começo cada dia já sabendo tudo que preciso fazer. Isso tem me ajudado muito a fazer tudo que precisa ser feito e a não ficar ansiosa. Ter tudo no papel traz um dado de realidade que ao mesmo tempo que me acalma, me ajuda a agir.

Como é sua relação com a tecnologia? O e-mail tem interrompido sua vida produtiva? Que ferramentas você usa para se manter organizada?

Tenho uma relação de amor e ódio com a tecnologia. Ao mesmo tempo em que me ajuda a realizar, às vezes me sinto escrava dela. Meu celular quebrou recentemente e estou com um que só me permite usar o WhatsApp e checar os e-mails que entraram. Não respondo, não vejo Facebook nem Instagram, nem Trello, nem nada. Nossa, que libertação! Não sei quanto tempo vou aguentar sem o vício de estar “conectada”. Me conecto com os outros e me desconecto de mim.

Isso sendo dito, uso Google Inbox, Google Agenda, WhatsApp Web, Trello pra coordenar as tarefas com as equipes, Google Drive pra poder acessar arquivos de qualquer lugar, meu caderninho, Doodle pra agendar reuniões entre muitas pessoas. Tentei usar o Franz, mas ainda não me entendi bem com ele.

Como costuma ser o seu local de trabalho? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para trabalhar?

Já trabalhei em espaços de coworking e foi essencial no início da minha transição de carreira para tecer rede e me conectar com as pessoas e projetos. Hoje trabalho de casa, pois além de atender em casa eu tenho valorizado muito focar e fazer o que precisa ser feito sem interrupções (minha mente já me interrompe suficientemente). Comer orgânicos feitos em casa, diminuir tempo de translado e parar de vez em quando pra cuidar das plantas também foram efeitos bem valiosos. Mas nem sempre estou em casa. Às vezes trabalho da casa do namorado, de um café ou de algum canto nas viagens.

Na minha mesa sempre tem água, computador, caderninho e uma música instrumental tocando.

De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?

Meu dia-a-dia é recheado de conversas profundas, que falam de processos internos. Sou apaixonada pelo ser humano e meus projetos são todos focados no processo de auto-investigação e auto-criação, porque é isso que mais me anima na vida: evoluir e acompanhar evoluções. Então o que mais me alimenta são essas conversas onde falamos a verdade e acolhemos o que quer que possa surgir.

Como você lida com bloqueios criativos, como o perfeccionismo, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?

Eu tenho facilidade em me jogar nas coisas, em criar, em começar projetos mesmo sabendo que não estão perfeitos. Digo que se queremos sempre o ideal, deixamos de fazer o que é possível. Gosto mais dos projetos curtos do que os longos, pois estou em constante transformação e preciso que isso esteja refletido no que faço.

Minha dificuldade é em sustentar projetos longos, em aguardar o tempo de maturação para o nascer de um projeto, em me engajar em projetos mais longos e complexos. Gosto muito da transformação, meu metabolismo de criar e transformar projetos é bem ágil, minha questão é em sustentá-los. Ainda bem que tenho ao meu lado pessoas que têm mais energia de sustentação do que eu.

Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? Que conselhos sobre produtividade não funcionaram para você?

O caderninho com a lista de afazeres me ajuda muito a não procrastinar. Eu também busco formar equipes complementares, com gente que goste de fazer o que eu não gosto. Fica mais fácil não procrastinar quando o que tenho pra fazer me dá prazer. Mas é claro que faço coisas que não me dão prazer, mas não tenho uma técnica específica.

O que tem me ajudado muito é lembrar que o processo de adultificação tem bônus e ônus. Não gosto de ir ao banco, de fechar planilha financeira, de ligar pra NET. Mas isso tudo faz parte de ser adulta. Estou numa busca profunda por me tornar adulta não só fisicamente, mas emocionalmente. Toda vez que me vejo procrastinando algo importante ou fazendo birra por precisar fazer algo chato, minhas anteninhas levantam: “Epa, Carol! Vamos ser adultas? Vamos lidar com as consequências das suas próprias escolhas?”.

Eu não acredito muito em técnicas se eu não estou internamente engajada em fazer aquilo. Se há um “não” interno, mesmo que inconsciente, posso até fazer, mas vou fazer com tensão. Não quero uma vida de afazeres do “tem que”. Quero uma vida onde reconheço a importância do que precisa ser feito e faço porque é o certo a se fazer. Estou comprometida em lidar com as consequências das minhas escolhas. Se não gosto das consequências, olho para o por quê de ter escolhido aquilo. E aí posso fazer novas escolhas.

Qual é o livro que mais mudou a sua vida e por quê? O que você considera inspirador ler ou aprender sem que lhe peçam ou esperem isso de você?

O Caminho da Auto-Transformação, da Eva Pierrakos. Demorei mais de um ano pra terminar o livro. A cada três páginas precisava parar pra processar aquilo internamente. Depois desse livro meu processo de auto-investigação deu uma espiralada, está cada vez mais difícil mentir pra mim mesma. Tenho dito que estou num processo de auto-honestidade radical. A cada passo que dou em direção a falar a verdade pra mim mesma minha vida fica mais autêntica. Não é necessariamente fácil, mas é libertador.

Leio e aprendo sem esforço sobre o processo de evolução, sobre trazer o inconsciente pra consciência e sermos mais adultos em nosso estar no mundo.  Tenho aprendido que só posso oferecer pro outro o que tenho. Que só posso levar o outro até onde já fui, então estou bastante focada no meu auto-estudo. Como consequência, posso apoiar o outro no auto-estudo dele.

Que conselho você queria ter ouvido aos vinte anos? Com o que você sabe hoje, se tivesse que começar novamente, o que você faria de diferente?

Não sei se queria ter recebido um conselho, mas gostaria de ter tido contato com pessoas que estavam investigando formas mais humanas de trabalhar e em uma busca por autenticidade.

Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?

Quero morar parte do meu tempo no mato, ainda estou estudando como viabilizar isso. Esse é o projeto que mais tem me movimentado internamente. Nossa, mexe tanta coisa pensar nisso! É mudar de paradigma, de estilo de vida, de carreira.

Que livro gostaria de ler? Não sei se ele vai existir um dia, gostaria de ler sobre quem sou eu por trás de tudo isso que acho que sou. Mas esse livro só eu poderia escrever e só eu gostaria de comprar.

Arquivado em: Entrevistas

Sobre o autor

José Nunes (@nunescnt) é doutor em direito pela Universidade de Brasília.

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